15 de outubro de 2017

Bora fazê filme?

The Shrine

Eu sei o que vocês fizeram com uma ideia na cabeça e uma câmera na mão! É visível e sabido que os meios digitais possibilitam uma economia considerável nas produções cinematográficas e os novos talentos que vêm se lançando na aventura de fazer filme parecem estar constituindo um gênero à parte no cinema fantástico contemporâneo.

O interesse nos alternativos e novos talentos vêm crescendo nos últimos anos. Uma vez que a produção dos recém-chegados venha aumentando é natural que as vias de exibição cresçam proporcionalmente. Feiras, convenções, festivais e streamings via web possibilitam tanto a exposição de novo material que o que antes era possibilidade hoje virou tentação! Por que não fazer?! E com o barateamento de captura, edição e efeitos, as distâncias técnicas entre o cinema profissional e o de baixo orçamento diminuíram.

O pioneiro histórico nessa linha foi o cinema trash, que tinha vontade acima de tudo e recurso nenhum. Cinema inadvertido! Mas enquanto o trash ainda precisava trilhar a produção tradicional (filmagem-revelação-montagem-distribuição) os aventureiros da era digital encurtaram a via crucis entre, ideia → realização → exposição.

Então o Black Phillip achou curioso sugerir aqui uma lista de filmes que poderiam ser de interesse a novos realizadores, só pra ver como certas questões técnicas foram resolvidas, ou se as intenções do projeto foram decentemente cumpridas ou não. São filmes que ficam naquela área intermediária (twilight zone) entre o respeitável cinemão de bilheteria e o filme amador, ou semi-profissional. Alguns não são tão ruins como se poderia supor. Outros são tão ruins ou tão cara-de-pau que servem como uma amostra do que não fazer quando realizar um filme e dos riscos habituais do fazer cinema... Aí vão então, 15 filmes como lição de casa.

The Burning Moon (Lua Sangrenta)
1992 The Burning Moon (Lua Sangrenta) • Olaf Ittenbach foi pioneiro da postura contestadora ao domínio de grandes estúdios e produções milionárias na era da popularização tecnológica. Como seu conterrâneo Jorg Buttgereit, iniciou carreira ainda nos tempos dos filmes feitos em vídeo (VHS, Beta). Esta é uma produção em episódios onde um jovem viciado conta duas histórias macabras para aterrorizar sua irmã menor na noite em que os pais estão ausentes. Na primeira, um assassino invade uma casa e extermina a família. Na segunda, um padre tem uma antevisão do inferno depois que violenta uma jovem. Então The Burning Moon é uma saudável proposta alternativa, uma profusão de idéias e efeitos que até alcança satisfatoriamente uma forma alucinada de narrativa. 😈😈

2005 Reeker (Pânico no Deserto, EUA) • Grupo de jovens em viagem fica retido em um hotel de estrada. São perseguidos e assassinados por uma entidade que ataca na região. Terror sobrenatural desastrado. Veja mais no post.

Il Bosco Fuori (Last House in the Wood)
2006 Il Bosco Fuori (Last House in the Wood) • Jovem casal é ameaçada em uma estrada deserta por delinquentes, mas são salvos por um passante que mora na localidade. Convida o casal a conhecer sua moradia e ali as coisas vão ficar realmente perigosas... Suspense tentando resgatar situações clássicas dos giallos e clássicos de terror. Mas o resultado é caseiro demais. Sem critério quanto seu próprio conteúdo. Uma visível ação entre amigos que utilizou recursos disponíveis e obviamente concentrou o orçamento na compra dos efeitos do mestre Sergio Stivaletti (Michele Soavi, Dario Argento). Resultado: ótimos efeitos de mutilação e sangue em um filme desajeitado, previsível e com elenco amador. 😈

The Hamiltons (Anjos da Morte)
2006 The Hamiltons (Anjos da Morte) • Depois do falecimento de seus pais, grupo de irmãos precisa sobreviver e parte para ações criminosas, sequestrando pessoas. Continuam em seus sub-empregos  como fachada social para seus atos. Mas por que sequestram garotas e as mantém acorrentadas no porão de casa? Canibalismo? Roubo de bens? O jovem Francis vive em conflito pelos atos dos irmãos e seu tormento pode por em risco a sobrevivência do grupo. Início de atividades dos diretores Phil Flores e Mitchel Altieri (os "Butchers Brothers") que ainda tentam, juntos ou individualmente, constituir carreira no terror e suspense. The Hamiltons é um suspense mediano que tem mais virtudes do que erros, mas ainda sofre com a produção simplória e naturalista e especialmente por um elenco inexperiente. Esforçado, mas visivelmente "tentando interpretar". Salvam-se a foto e iluminação bem cuidada. 😈😈

Grace2009 Grace (USA, Canada) • Depois de uma gravidez complicada Madeline dá à luz a um natimorto, como se suspeitava por seus exames. Mas, para surpresa de médicos e de pessoas próximas, o bebê dá sinais de vida depois de alguns minutos! Grace é um exercício em economia pela redução de luzes, elenco e cenários. Praticamente é Madeleine em sua casa na maior parte da duração do filme. Também é um caso a se questionar os limites do terror. E isso nem é uma questão de defender "bom gosto" versus "provocação", e sim questionar conteúdos justificáveis à proposta fílmica. Mamadeira de sangue??!! É piada? O bebê desenvolve um suspeito gosto por sangue e a mãe precisa alimentá-lo... É uma situação minimalista que precisa ser estendida pelo filme todo para cumprir o tempo, então a repetição de informação e as longas sequências de suspense comprometem bastante o conjunto! 😈😈

Laid to Rest2009 Laid to Rest (EUA) • Garota desmemoriada desperta em seu cativeiro. Ela foi raptada por um misterioso assassino com máscara de caveira e precisa escapar, mas seu captor a persegue fazendo mais vítimas no trajeto. Terror que tenta entrar no terreno detalhista do torture porn, mas fica no convencional slasher de matanças com um maníaco que usa uma câmera sobre o ombro para filmar as mortes. Laid to Rest não tem muito o que fazer com sua estrutura convencional de roteiro, mas os esforços técnicos e o cuidado fotográfico se destacam como justificativas. Sua grande vantagem é a imagem da caveira cromada, tão marcante que gerou a sequência Crome Skull em 2011. No elenco a participação cult de Richard Lynch e Sean Whalen, o garoto sem língua de Criaturas Atrás das Paredes. 😈😈

The Shrine
2010 The Shrine (Canadá) • Este por pouco ficou fora da lista por causa da eficiência na ação e suspense da parte final. É uma produção correta e bem feitinha. Correta até demais: luz certinha, movimentos de câmera ensaiadinhos, roteiro bem convencional. Mas essa premeditação toda é evidente demais. Tudo ensaiadinho cumprindo o protocolo, tudo feito como se fosse pelo manual e portanto muito sem tempero. O resultado é previsível, quase monótono. Mas melhora muito na segunda parte com as perseguições e revelações. Uma jornalista faz matéria sobre o desaparecimento de um jovem que viajava pela Europa e sua investigação a leva a um vilarejo no interior da Polônia onde um culto ancestral faz sacrifícios humanos! A melhor parte é a diabólica estátua no meio da neblina! 😈😈😈

Horrible Way to Die
2010 Horrible Way to Die (EUA) • Presidiário escapa quando de seu transporte entre instituições e consegue se envolver com uma garota. A jovem faz tratamento em grupo por causa de sua dependência de álcool e demora a desconfiar que o maníaco é um serial killer compulsivo. Thriller mediano que causa surpresa com os piores enquadramentos em câmera solta já vistos! É simplesmente impossível acompanhar a maioria das sequências por causa da incoerência das imagens balançando na tela! O trocadilho é uma tentação: Horrible Way to Shoot! Um grande exemplo de como deve ser difícil tremer a câmera sem perder o assunto do take e a coerência narrativa. 😈

2011 The Bunny Game (FRA) • Jovem prostituta é raptada por um caminhoneiro e submetida a um tormento emocional encarcerada na traseira vazia do caminhão. Estilização na onda do cinema extreme com um acabamento fotográfico excepcional. Veja mais no post.

Absentia
2011 Absentia (EUA) • Callie vai morar com sua irmã Tricia para acompanhar sua gravidez. Tricia passa por um momento difícil depois do misterioso desaparecimento de seu marido. Callie tem visões em uma passagem próxima da residência e descobre que o local vem causando o desaparecimento de pessoas desde o século passado! Absentia é o caso mais questionável de inclusão nesta lista uma vez que o diretor Mike Flanagan tem grande domínio da narrativa e dos níveis emocionais necessários à credibilidade do filme. Mas a busca por "realismo" quase põe o filme a perder em sua inclusão de ambientes caseiros, filmagem na rua e tipos físicos corriqueiros. O problema é: o fantástico não se encontra nas ruas! Nem dentro de casa! Então a busca por "autenticidade" seria questionável. Pode desqualificar o filme mais do que contribuir em sua aceitação. Assistir a este filme e em seguida Oculus, do mesmo diretor, dá uma boa dimensão do questionamento aqui comentado sobre o "fazer cinema". 😈😈😈

Skew
2011 Skew (EUA) • Um casal e seu amigo Simon, saem em viagem de carro. Simon registra tudo em sua câmera a ponto de irritar seus amigos com sua insistência em documentar. Simon começa a perceber que a filmagem tem alguns misteriosos efeitos de blur na face de algumas pessoas. Percebe também que essas pessoas morrem misteriosamente depois de filmadas! Em alguns momentos Simon parece ter visto espíritos, mas a captura não os registrou no material gravado! Então Skew é o found footage mais sem-vergonha já realizado. Absurdamente desinteressante, sem acontecimentos e com duas ou três linhas de diálogo que justifique a trama. Oitenta minutos de registro em estradas e quartos de hotel na produção mais barata do mundo. 😈

The Pact (Pesadelos do Passado)
2012 The Pact (Pesadelos do Passado, EUA) • Depois do falecimento de sua mãe, Annie volta a morar na casa em que viveu na infância. A casa parece ter algum ente maligno que circula em armários e corredores. Annie é atacada em uma das noites por um força invisível. E as investigações acabam por descobrir tanto entes espirituais quanto agentes físicos no local! Simplório e naturalista em sua produção, com grande parte das filmagens dentro da mesma casa e só a protagonista em cena. Seu mérito enquanto cinema é construir interesse e suspense sem partir para os excessos que o gênero permite e até exige nas produções atuais. 😈😈

2013 Th3 Pit (ITA) • Jovem recluso é investigado por professor a pedido de sua mãe. Uma das amigas do garoto está desaparecida e as investigações levam a um grupo (ou seita) de participantes de uma rede digital que pode estar raptando pessoas locais. Obscura produção italiana cuja maior curiosidade é ter sido dirigida Filippo Di Masi, filho de um famoso compositor de trilhas de faroeste. Seu conceito visual não ajuda nada: a maioria das cenas é capturada de câmeras manuais ou câmeras de notebook para a sugestão de realismo found footage. O grande erro decorrente, enquanto cinema, é o distanciamento emocional causado pela estética pouco interessante, difusa e noturna. Maior virtude: a trilha sonora do novato Furio Valitutti. Veja mais em found footage. 😈

2014 Starry Eyes • Este é o mais errado de toda esta lista porque é o filme profissionalmente mais bem acabado dos destacados. Mas ainda é possível sentir a mão do diretor conduzindo e até o roteiro convencionalmente estruturado é sintoma de que a premeditação reina sobre o filme e não exatamente a seu favor. É sobre jovem atriz que faz entrevistas para uma produção suspeita. Veja mais no post.

Bornless Ones
2016 Bornless Ones (EUA) • Casal se muda para uma casa próxima a uma floresta. Emily precisa tratar seu irmão deficiente e o local afastado é ideal. Junto deles vai um casal amigo acompanhar a mudança. Mas os espíritos que habitam o local irão se manifestar no rapaz deficiente e depois em cada um dos presentes que começam a se atacar como em uma contaminação. Clara imitação de Evil Dead em resultado até bacaninha de ver. Pobrinho de efeitos, mas o empenho do elenco e a dinâmica de direção e montagem sustenta o show enquanto exercício de quem está aprendendo o ofício. Seu mérito principal é conseguir uma boa construção de imagem e escapar da monotonia visual. 😈😈😈

Para ver um pouco mais de filmes duvidosos visite 20 Coisas Feias.

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