7 de dezembro de 2020

Outsider - o real e o sobrenatural em um texto de continuidade obsessiva.

outsider

A cortina do chuveiro balançou mais uma vez. Balançou porque o que o detetive queria acreditar que era a esponja de lavar as costas agora ficou com dedos escuros e se esticou para tocar o plástico. O chuveiro se virou e pareceu olhar para ele pela cortina semitransparente. O jornal caiu dos dedos frouxos de Hoskins e foi parar no piso com um barulho suave.

• Um bom representante do gênero "impossível parar de ler". Outsider é mais um dos trabalhos maduros do pop-star do fantástico moderno, Stephen King. Contando sobre a investigação pelo detetive Ralph Anderson sobre um bizarro infanticídio, o livro dispara a tensão logo nos primeiros capítulos com a captura do assassino, ninguém menos do que o querido e simpático treinador Terry Maitland, encarregado dos times de baseball infantis, conhecido e respeitado na cidade. Todas as pistas e testemunhas apontam para ele. Mas o Treinador T também tem sólidos álibis e a narrativa acumula tensão emocional e uma investigação repleta de pistas, detalhes e personagens paralelos até que uma reviravolta digna de Psicose muda as estruturas. E o que era um thriller investigativo gradualmente cede espaço ao sobrenatural. 

Não quero o meu filho nesta cidade enquanto você ainda estiver revirando essa confusão. Porque, quando escurecer hoje, vou ficar com medo. E se for mesmo alguma criatura sobrenatural, Ralph? E se essa coisa descobrir que você está atrás dela?

No hiato narrativo central é realmente admirável como King insere a "fantasia sobrenatural" de forma sutil e gradual. A teia de intersecção entre o real e o fantasmagórico é uma das grandes virtudes da obra e o autor se arrisca (achei que até demais) no espaço dado a personagens secundários na parte de conclusão, com seus falatórios constantes. Finalmente, a narrativa se entrega ao fantástico quando um grupo se forma para caçar uma possível entidade obsessora, o outsider do título, traduzido como forasteiro no texto.

Uma criatura que vive de infelicidade, um comedor de sofrimento.

Só para exercitar a chatice, e como já muito foi destacado nos comentários de livros do blog, a maioria dos autores que lemos no fantástico moderno se esforçam muito para entregar livros quase no formato de roteiros cinematográficos e assim encurtar o caminho de uma possível adaptação para o cinema. Em Outsider a sensação é de que o livro busca a forma de uma série de TV em sua sucessão de blocos narrativos segmentados e entradas e saídas de personagens! Pois bem, a obra, sem surpresa já virou série da HBO! Então, senhor King, essa obra é literatura ou roteiro de série?!

Rabugices à parte, Outsider é daqueles livros que não dá chance ao desinteresse. Em texto fácil, personagens ricos e capítulos curtos, o livro flui com notável destreza do racional para o fantasioso.


Leitura Radical
A segunda parte é arrastada...

Leitura Passional
Um texto que agarra a percepção.
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Outsider

Outsider, Stephen King, 2018
Suma das Letras - Rio de Janeiro, RJ - 2018
520 páginas

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